Te prometo ser fiel???????

Fidelidade não é um cheque assinado em branco no altar nem algo que se deve cobrar do outro como uma atitude ética de sua parte. Fidelidade é um efeito colateral de uma relação saudável, vem de dentro para fora, não é algo que se prometa: simplesmente se vive, como conta aqui Cleidi Lopes em suas impressões pessoais sobre o amor.

O "Aurélio" lista cinco diferentes definições para a palavra "fidelidade" e uma me chamou bastante a atenção: 3. Observância rigorosa da verdade; exatidão.
Uma análise superficial deste conceito parece lançar uma perspectiva impossível para o ato de existir fidelidade, não somente nas relações amorosas, mas em qualquer outra.
A princípio, poderia perguntar: existe algum casal que nunca tenha mentido, mesmo uma "pequena mentirinha" um ao outro? E olhando por aí, acho bem difícil que este tipo de "fidelidade" construa algo estável. Porque sei de mentiras ou omissões usadas com discernimento, que salvam. Mas nas relações amorosas, que é o foco aqui, quem, mas quem poderá construir anos de convivência observando rigorosamente a verdade (com total exatidão), na maneira como está exposta no conceito acima para que alguém se diga fiel?
Acho que seria necessário muito mais do que uma cumplicidade para isso. E eu nem sei dizer o que seria necessário, considerando que toda pessoa é uma entidade em constante dinamismo, evolução, mudança e crescimento. E quantas vezes deixamos de ser fiéis a nós mesmos, quando somos atravessados por entidades mentais ilusórias, que nos geram torpes enganos? Então, que dirá prometer ao outro uma "estaticidade" inexistente na própria natureza das coisas, para que se permaneça "imutavelmente" fiel. Para mim, isso trata de algo paradoxal mesmo. E então, considerando isto, há de se procurar entender que talvez o "Aurélio" esteja querendo indicar outro tipo de verdade, capaz de cortar as pequenas mentiras e, ainda assim fazer, existir uma relação estável, harmoniosa e fiel em si mesma. Que verdade seria esta? Só vejo uma: a do amor, do transcendente amor!
Conceber a fidelidade numa relação implica em algo que brota natural e suavemente da própria certeza do amor. O amor pede provas ao longo da convivência entre as pessoas e são justamente estas "provas", oferecidas no altar do amor, que jogam para longe a possibilidade dos parceiros se sentirem traídos. Pela observância rigorosa do ato de amar, nós nunca iremos desejar que o nosso parceiro traia a si mesmo para manter o relacionamento. Sabe-se que o preço de alguém trair seus sonhos, seus desejos, sua força e vitalidade em nome desta "fidelidade conjugal" é a separação, advinda da falta de respeito ao outro em sua integridade.

Então, vejo muito claramente esta fidelidade prometida, jurada e sacramentada no altar da sociedade deslanchar muito mais em infidelidades. Fidelidade não é algo que se prometa, não é um cheque assinado em branco e, sim, um maravilhoso estado de bem-aventurança que nasce de uma fonte que está muito acima das necessidades egóicas de cada ser, algo que só podemos tocar juntos se nossos corações estiverem alinhados numa mesma sintonia.

"Observância rigorosa da verdade; exatidão", sim!
Exatidão na verdade dos sentimentos que estão no coração. Cada parceiro, ser fiel e verdadeiro, exato e justo, sobretudo consigo mesmo é o que manda a Lei Maior e, se isso for harmonioso com a Verdade do seu/sua parceiro/a, estará concretizada na relação, a fidelidade que não exige nem cobra mas, antes de tudo, alimenta e liberta os seres para voarem lado a lado no céu dos seus sonhos.
Para mim, fidelidade é isso. Um vôo de mãos dadas, sorriso nos lábios, música no corpo na convergência de um sonho incomum. E se este sonho for em comum haverá fidelidade; do contrário, não haverá e ponto final.

Cleidi Lopes
Enfermeira e Bibliotecária formada pela UFF (Universidade Federal Fluminense)
cleidi.lopes@terra.com.br
SÃO GONÇALO/RJ


Foto: Eliana Lúcio

2 comentários:

  1. Bah Cleidi!! Muito difícil esse negócio de fidelidade que eu também prometi um dia na vida!!Quem dos três será o mais fiel na figura lá do início?? risos... Deve ser o cãozinho porque que relação saudável tem sempre o cão com seu dono?? Ta aí o efeito colateral: Fidelidade!! Já os humanos...não sei não...Prá mim Aurélio define fidelidade de forma tão contundente porque ele mesmo dela desconfia e assim "desesperou-se" e caprichou no rigor da sua definição!! Será amiga? De resto daria um grande texto então fico aqui e me apresento prá ti Cleide pois sou enfermeira e docente na escola de enfermagem da UFRGS. Um beijo da Elena.

    ResponderExcluir
  2. Obrigada Elena pela tua observação.

    Considerando a imagem, acho que seria unânime a opinião de que ali, pela própria característica do amor incondicional, a cachorrinha dá de mil "na observância rigorosa da verdade", no seu carinho e dedicação pelos donos. Aliás, para mim são eles a própria personificação do que seja fidelidade. Mas só a título de curiosidade posso testemunhar deste casal também, que são muito “show” em amor e cumplicidade e consequentemente fidelidade.

    Agora, quanto a nós humanos, não quero de todo ser descrente, afirmando que ela (a fidelidade) não seja possível. Talvez seja rara, como é raro a gente saber de casais que se despedem um do outro, ao final do seu ciclo de vida, com a mesma paixão no olhar.

    Eu apenas quis enfatizar que se este conceito de “fidelidade” não for estendido para dimensões muito além do ego, será difícil achar alguém fiel, dada a própria característica dinâmica da nossa evolução psico-espiritual. Sem transcender os padrões egóicos acho que não dá.

    É um assuntinho que dá pano pra manga mesmo.

    Beijão pra ti, e é muito bom conhecer uma colega de profissão via Absoluta.

    Valeu!

    Cleidi

    ResponderExcluir

 
Série Temática Edição Absoluta/Amores. Coordenação e Design: RICARDO MARTINS.